Bem, com dois geeks cá em casa, toneladas de livros, artigos e um curso de preparação no centro pré e pós parto, o que não falta é informação teórica sobre como cuidar de um bebé aqui pelo lar. Já sabemos a teoria toda sobre cuidar de um bebé.
E já sei que esta afirmação provavelmente provocou num pai ou mãe experiente, uma reacção de riso de "não fazes ideia". É que sofremos, eu e a Plaft, essa reacção constantemente, se alguma vez nos atrevemos a dar uma opinião na presença de pais experientes, mesmo pais que foram pais recentemente e que estão a discutir um problema. É normal "gozarem" com um pai ou uma mãe que leia um mero livro sobre bebés ou que repita algo que aprendeu com enfermeiras especializadas em cuidados maternos, mesmo que seja contextualizado numa conversa. De facto, quando alguém questiona uma prática que pais aplicam aos próprios filhos, está a tocar num ponto muito, muito sensível, mesmo que queira simplesmente ajudar e partilhar algo que leu.
Dito isto, é preciso entender que práticas herdadas ou culturais não são necessariamente as melhores e que a teoria, em muitas áreas do comportamento humano, antecedeu a prática, a cultura ou aquilo que é intuitivo. Foram estudos que determinaram que o uso de cinto de segurança aumentava a probabilidade de sobreviver a um acidente ou que o tabaco causava cancro. Mesmo assim, é muito normal as pessoas não usarem cinto quando vão no banco de trás ou fumarem, assim como era normal quando eu era criança, ir a dormir deitado no banco de trás, sem cinto, com ambos os meus pais a fumar de janelas abertas. Também penso que me deitavam de barriga para baixo, quando se sabe hoje em dia que a Síndrome de Morte Súbita é melhor prevenida se o bebé dormir de barriga para cima. Daqui a 30 anos, haverá certamente mais informação e seremos nós, os pais de agora, os desactualizados, a não ser que façamos um check up à informação antes de dar conselhos aos nossos próprios filhos ou a pais recentes.
Em tudo o que diz respeito a bebés e crianças, as zonas cinzentas são enormes, dependem da cultura, do conhecimento, da educação que se teve. A ciência também deixa muitas perguntas sem resposta. Há práticas recomendadas pelos médicos que variam de zona geográfica para zona geográfica. A Internet é um mundo. Mesmo os profissionais de saúde, com anos de experiência, têm opiniões contraditórias. Curiosamente, são muitas vezes os jovens profissionais de saúde, os médicos e enfermeiros que acabaram de estudar os assuntos e que são os menos experientes, que acabam por ser os mais abertos e mais informados, havendo até conflitos de práticas em maternidades. Não foram nem uma, nem duas as enfermeiras especialistas que nos chamaram a atenção para o facto de hoje em dia, muitos pais terem até mais informação que os próprios profissionais de saúde com determinadas formações e culturas e que os pais devem ser assertivos quando estão convictos de uma prática.
Aquilo que me irrita um pouco na atitude de ignorar informação disponível e repetir práticas erradas (de acordo com a última informação) no cuidado de bebés ou em pedagogia, é exactamente o mesmo que me irrita quando alguém faz uma dieta que se sabe ser errada ou treina para corrida com métodos errados, de acordo com a informação disponível e perfeitamente acessível na internet, em livros ou em cursos simples e baratos. Todos nós temos reacções quando algo nos parece contra-intuitivo, devido
ao facto de, ao aceitarmos esse facto, nos sentirmos atingidos pessoalmente, muito mais no caso de uma coisa que nós próprios fazemos e ao qual nos dedicamos. No caso dos nossos filhos isto é muito exacerbado e começa logo na gravidez...
É evidente que a teoria não faz um bom pai ou mãe e que da teoria à prática vai um mundo enorme. Mas dizer isso é redundante, não é? Um piloto da força aérea tem aulas teóricas em que aprende mais ou
menos como funciona a máquina que vai pilotar, antes de se meter no
cockpit de um F16 sozinho. No caso de um bebé, a comparação mais
adequada seja um tupolev russo dos anos 70, das linhas aéreas somalis,
num dia de tempestade de areia e trovoada, tendo a bordo a selecção de
Israel e uma dúzia de muçulmanos de mochilas às costas com ar suspeito. Mas o meu ponto é que faz parte se tentar ser bom pai... tentar ser bom pai. Isto é, demonstrar interesse e curiosidade, no mínimo. E perante problemas evidentes, ser flexível e questionar as próprias abordagens e investigar um bocadinho.